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Foi aprovado na Câmara nesta terça o Projeto de Lei nº 298/2022, do vereador pastor Roberto Oliveira Teixeira (Republicanos, 3º Mandato), que obriga a manutenção de pelo menos dois exemplares da Bíblia nas bibliotecas públicas do município, inclusive as localizadas em escolas.

Uma clara afronta ao princípio constitucional do estado laico. A vereadora Telma de Souza (PT, 4 Mandato), tentou amenizar a proposta apresentando uma emenda para que seja também obrigatória a manutenção de livros ou escrituras sagradas de outras religiões professadas no Brasil, identificadas pelo último censo do IBGE. O projeto foi aprovado sem prejuízo desta e de outras duas emendas, todas encaminhadas à Comissão de Constituição e Justiça para análise.

A vereadora Débora Camilo (PSOL, 1º Mandato) votou contra o projeto e disse que caso ele seja transformado em lei, seu mandato acionará a Justiça para afirmar a sua inconstitucionalidade e garantir o direito ao Estado Laico, observado na Constituição. Chico Nogueira (PT, 2º Mandato) também se posicionou contrariamente.

Audrey Kleys (Novo, 2º Mandato), Benedito Furtado (PSB, 5º Mandato) se abstiveram.

Censura
O autor do projeto, que pertence a Igreja Universal do Reino de Deus, tem todo interesse no assunto porque é por meio do nicho religioso protestante que tem conseguido se reeleger a cada quatro anos. Não à toa, na mesma sessão o parlamentar apresentou outro trabalho, também inconstitucional e ligado ao tema de interesse dos eleitores conservadores. Trata-se de um requerimento para que o Governador Tarcísio de Freitas crie uma lei que regulamente o conteúdo de mídias utilizadas nas escolas públicas e particulares do e
Estado de São Paulo, tornando crime a reprodução de materiais que contenham “mensagens depreciativas”.

Na justificativa ele defende que seja considerado crime a apresentação de mídias em escolas públicas e privadas, que “estimulem, por meio de expressões e conteúdos pejorativos ou ofensivos, as crianças e adolescentes do nosso Estado, pois os mesmos têm sido vítimas desses tipos de apelações midiática de cultura em massa, tendo sua formação de postura social influenciada”.

Para ele este tipo de conduta é um “gigante desrespeito à moral pública e aos bons costumes”. Para quem entende minimamente qual o papel da democracia e da educação, o requerimento, sim, é uma ofensa à sociedade que, a duras penas, conquistou alguns avanços na Constituição de 1988.

Projetos de lei que proíbem professores de veicular conteúdo ou promover atividades “que possam estar em conflito com as convicções religiosas ou morais dos pais ou responsáveis pelos estudantes” têm sido chamados de “escola sem partido”. Nos últimos anos, esse tipo de trabalho legislativo ganhou similares em estados e municípios e muitas críticas entre constitucionalistas.

O problema apontado é que o artigo 5º da Constituição Federal garante a liberdade de expressão, enquanto o artigo 206 garante a liberdade de ensino. Assim, vedar, previamente, que professores falem sobre algo que “possa estar em conflito” com a convicção alheia contraria a Constituição.

Para quem estuda o Direito Constitucional, o artigo 206 não substitui o artigo 5º, mas se soma a ele. Ou seja, por ter liberdade de ensino garantida, o professor não perde o direito à liberdade de expressão, que não pode ser suprimido de nenhum brasileiro.

Criminalização do pensamento
“Isso é tentar controlar os professores por intermédio da criminalização do pensamento”, afirma o jurista Lenio Streck, que coordenou o livro Comentários à Constituição do Brasil. Na mesma obra, o constitucionalista Daniel Sarmento explica que a censura, em sua concepção mais tradicional, envolve o controle preventivo das mensagens cuja comunicação se pretende fazer. “Trata-se do mais grave atentado à liberdade de expressão que se pode conceber”, afirma Sarmento.

A escola deve ser pluralista. Não é papel de um vereador formular esse tipo de proposta, obrigando a adoção de uma linhagem de pensamento político-religioso.

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