A Câmara de Santos aprovou, em sessão realizada nesta quinta-feira (18), a obrigatoriedade da instalação de câmeras de monitoramento em todas as escolas municipais. De acordo com a proposta, as imagens, geridas pelo Centro de Controle Operacional (CCO), deverão ser disponibilizadas em tempo real aos pais e responsáveis durante o período em que o aluno estiver presente na creche ou escola.

Especialistas em Educação e sindicatos que representam os professores são radicalmente contra esse tipo de medida por vários motivos. Para eles, trata-se de patrulhamento ao trabalho dos professores, que têm autonomia em sala de aula.

A liberdade de cátedra é um princípio constitucional, previsto também na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996. Dentro da sala de aula o professor é autoridade, estando totalmente capacitado para a função. “Não tem cabimento que professores e professoras sejam assediados e que tenham seu trabalho tolhido desta forma”, argumenta nota da Apeoesp, por ocasião de uma determinação do Governo do Estado de monitorar em vídeo as atividades dos professores em sala de aula, inclusive com rotina de observação das aulas para produção de “relatórios de monitoramento”.

Além da vigilância ao trabalho do corpo docente, outro argumento contrário à ideia é o risco de vazamento das imagens de crianças. “Sabemos o quanto tem crescido o uso de imagens de menores por predadores sexuais, inclusive em sites com conteúdos pornográficos”, alertou a vereadora Débora Camilo (PSOL, 1º Mandato), que votou contrariamente.

A vereadora Telma de Souza (PT, 4º Mandato) também registrou voto contrário e ponderou para o erro de reduzir o conceito de segurança escolar. “Entendo que prover segurança às crianças envolve uma gama de fatores, que vão desde o Guarda Municipal que auxilia os alunos a atravessarem a rua até a qualidade da alimentação servida, a quantidade suficiente de professores, estrutura adequada nas escolas e valorização dos educadores”.

O terceiro voto contrário foi do vereador Benedito Furtado (PSB, 5º Mandato). “Que se faça um plebiscito entre os pais. Com certeza a maioria não concorda com a gravação de imagens de seus filhos”.

O Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Santos (SINDSERV) também desaprova o projeto, de autoria do vereador João Neri (União Brasil, 1º Mandato).

Além de ser inconstitucional, o projeto certamente causará um patrulhamento ideológico no conteúdo e nas abordagens pedagógicas, ameaçando os princípios constitucionais e demais normas que regem a educação nacional, em especial quanto à liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber e ao pluralismo de ideias.

“Pode, inclusive, trazer confusão e interpretações equivocadas. Uma cena descontextualizada de uma professora segurando uma criança pelo pulso ou qualquer outra contenção física visando que não machuque, cause acidente a si ou a outro colega, pode dar a entender que é uma atitude ríspida ou descabida, caso o aluno puxe o braço, por exemplo”, diz a diretora da entidade, Teresa Borges.

Ela entende que se o argumento é a segurança, as câmeras podem ser usadas no máximo em corredores, pátio e área externa. “Sobre a criança que faleceu após sofrer bullying em uma escola em Praia Grande, caso houvesse monitoramento nas áreas comuns a tragédia não teria acontecido. Entretanto, é importante frisar que é preciso ter um número adequado de funcionários nas escolas”.

A coordenadora geral do SINDSERV, Márcia Caldas, também é contra e cita como contradição à proposta o estado precário em que se encontram muitas escolas. “O dinheiro que seria usado na instalação de centenas e centenas de câmeras poderia ser alocado investimentos mais efetivos na qualidade do ensino e na melhoria das condições de trabalho”.

Mesmo com todos os senões, ao final da discussão, o projeto foi aprovado por 15 votos a 3. Em caso de sanção pelo prefeito Rogério Santos (Republicanos), a administração municipal deverá desenvolver um aplicativo que transmitirá o monitoramento mediante o uso de senha a ser transmitida aos responsáveis.

Segundo o PL 247/2021, os únicos lugares que não terão monitoramento serão banheiros, vestiários e áreas restritas. O texto ainda prevê que as imagens serão gravadas e arquivadas por no mínimo 90 dias.

Após o envio ao Poder Executivo, o prefeito terá 15 dias úteis para sancionar, vetar parcialmente ou totalmente o PL. Em caso de sanção, a lei entra em vigor 180 dias após a publicação.

Por vício de iniciativa, ao criar despesa ao Município pelo Legislativo, o projeto certamente será vetado. E como tem ocorrido cotidianamente, a Câmara deverá acatar o veto, pois a maioria dos parlamentares é da base do Governo.

VEREADORES, PARA QUEM ELES TRABALHAM?